terça-feira, setembro 28, 2010

OS BALAIOS DE OLGA



Um episódio ocorrido recentemente, me fez voltar no tempo e recordar o primeiro balaio que Olga não pode ter.

Mãe de três filhos, ainda pequenos, Olga “lavava roupa pra fora”. Levantava bem cedinho, enchia os oito fios do varal... Ainda não tinha máquina de lavar. Seu maior problema naquele momento era recolher aquela roupa toda. Usando sua criatividade feminina colocava uma cadeira para apoiar as roupas que eram recolhidas e dobradas com o maior cuidado para facilitar na hora de passar. Mas tinha em mente a vontade de comprar no mínimo uns três balaios.

Isto me inquietava, pois não via neste detalhe grandes vantagens. Então resolvi presentear Olga com um belo espelho oval, com acabamento em vime. Ao chegar a sua casa lá estava ela, dividida entre os seus três filhos, o tanque de roupas e o almoço. Não esqueço a imagem de decepção em seu rosto ao vê-lo refletido no espelho e percebendo que ainda não havia tido tempo para pentear seus próprios cabelos. Toda sem jeito agradeceu o presente e me convidou pra almoçar. Resolvi ficar, e observar um pouco mais a rotina da minha amiga Olga, que não parava um instante. Voltei para casa um tanto quanto preocupada, mas esperançosa de que um dia Olga olharia para aquele espelho de uma maneira diferente.

Certo dia um senhor bateu palmas na frente de sua casa. Olga foi atendê-lo, e para sua surpresa ele estava vendendo balaios... Toda entusiasmada ela pensou: Puxa, é hoje que vou comprar meu primeiro balaio. Mas, não dispunha do dinheiro naquele momento. O senhor muito gentil, deixou que Olga ficasse com o balaio dizendo que passaria no dia seguinte para cobrar. Tudo bem então. Pelo menos por enquanto.

Quando seu marido chegou a noite, ela contou o ocorrido e pediu o dinheiro para pagar o balaio, mas nada feito, o sujeito foi categórico: “Devolva este balaio amanhã”...eu não autorizei você a comprar um balaio, não vou pagar! Nossa essas palavras soaram como uma advertência grosseira e insensível aos ouvidos de Olga, que indagava consigo mesma:

“Ai meu Deus, com que cara irei devolver este balaio? Ainda demora até que eu receba pelo meu serviço e aquele senhor precisa do dinheiro. Que noite foi aquela. Olga torturava-se arrependida pelo que havia feito, ao mesmo tempo que não entendia a reação do marido, pois para ela o balaio significava apenas mais um instrumento de trabalho. O que haveria de tão errado em sua atitude?

Enfim, no dia seguinte, veio o senhor cobrar o balaio. Explicou a ele o que havia ocorrido, mas pense, ele ficou fulo e saiu resmungando com ela.

Este relato ilustra apenas um dos rompantes de submissão de Olga, que foi conduzindo sua vida de dona de casa exemplar, super mãe e esposa obediente.

Os anos foram passando e hoje aos 43 anos, Olga me confessou que pode perceber que este foi só o primeiro dos vários balaios que ela deixou de ter na vida. Afirma ter renunciado a inúmeros balaios no decorrer de todos estes anos.

Segundo Olga, suas renúncias foram impulsionadas mais por medo e submissão do que por amor. E agora que seus filhos cresceram e que não precisa mais lavar roupas pra fora, está tentando resgatar seu primeiro balaio, que denomina como o “balaio da minha dignidade como mulher”. Disse que está difícil encontrar compreensão, porque percebe que somente ela mudou nesta história toda quando ousou olhar-se novamente no espelho e perceber-se como gente.

O maior desafio de Olga agora é mostrar-se como nunca se mostrou a si mesma e aos outros.

Isto é apenas um resumo de uma migalha da vida de Olga. De um momento em que pensou que um balaio poderia mudar sua vida. Ajudaria é claro no quesito organização, mas o que ontem parecia tão importante hoje já não faz mais sentido, pelo menos não o mesmo sentido da época. O balaio a que se refere hoje, não é o da lavadeira, da super mãe, da esposa obediente, mas sim da Mulher Olga, ao descobrir que dedicação e amor são sentimentos que devem sim ser partilhado com todos, mas, esquecer-se de si mesmo é a maior crueldade que um ser humano pode cometer.

Autora: Marcia Kraemer